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Candonga

Mercado negro de ideias da minha cabeça.

Candonga

Mercado negro de ideias da minha cabeça.

28 de Janeiro, 2022

Interregno

Bruno Gouveia

Passei um dia sem escrever, ontem. E no dia anterior escrevi pouco e sem interesse. Desculpo-me com o cansaço e depois sinto-me culpado por não estar a conseguir atingir os meus objectivos. Depois penso que os objectivos não interessam e que estar a escrever esta bodega não serve propósito nenhum. Está angústia alastra-se a tudo. Já penso em desistir da série Faculdade, já nem leio mais nada que não seja banda-desenhada. Penso no que a terapeuta disse, para ser flexível com os objectivos e para não deixar o descanso para segundo plano. Talvez tenha razão mas custa-me na mesma. Parando com as lamúrias, deixa cá ver se me lembro do dia de ontem.

 

O Gaspar fez 15 dias. Está mais pesado mas não o medi, não sei se está mais comprido. Continua a fazer o tempo passar em flecha. É como uma máquina do tempo, aceleradora de vidas. A quantidade de músicas com cocó que lhe canto para o tentar, sem sucesso, adormecer aumentou. Hei-de gravar algumas das canções de embalar parvas para ficar para a posterioridade. Pode ser que me torne o Papá Balbucios, um Avó Cantigas em versão deprimente.

 

Falar no Avô Cantigas faz-me pensar na capacidade que as pessoas têm de não sentir vergonha delas próprias. Os músicos, políticos e muitas mais profissões que requerem exposição pública deixam-me espantado. Eu nunca conseguia perder a vergonha na cara. As figuras que fazem em frente a milhares de pessoas dão-me ansiedade. Invejo-os. Há coisas que deixo de fazer só com o receio do que vão pensar de mim, mesmo sabendo que toda a gente se está bem a cagar para o que eu faço ou deixo de fazer, tal como eu também estou para o que os outros fazem. Acho que quero escrever um blogue mas não sei deva usar um pseudónimo ou o meu nome real. Não devia ter medo não é? Ainda não estou pronto. Expor os meus pensamentos é um tema muito sensível. Talvez um dia.

 

Agora falando do dia de hoje, está a ser atribulado. De manhã fui à loja do cidadão para fazer o cartão de cidadão do miúdo (já tinha ido ontem mas quando lá cheguei já não haviam senhas), esperei mais de uma hora pela minha vez e quando fui atendido o senhor indicou-me que se o bebé não for presencialmente tirar a fotografia o cartão irá demorar até dois meses para chegar, enquanto que se levar lá a criança deve demorar duas semanas. Voltei a casa, peguei na mãe e no filho e lá voltei. Pedimos prioridade, aproveitamos que o garoto tinha fome e estava acordado para tirar a foto e resolveu-se o assunto. Voltamos a casa, almocei e tirei uma desta no sofá e voltamos a sair de casa para vir ao centro de saúde para lhe dar a vacina da BCG. Está é a vacina que tivemos de fazer marosca, seguindo sugestão da enfermeira, para ter direito. Como não vivemos numa zona de risco elevado de tuberculose, tivemos de dizer que no primeiro ano de vida o bebé iria ficar em casa da avó que vive no Porto, conselho que já tem o risco elevado.

 

Toda a gente está com Covid. Vários colegas da minha namorada e uma colega minha. Uma amiga minha, que vive ao pé do centro de saúde e queríamos aproveitar a vinda ao Portos para estar com ela, também apanhou. Colegas da minha mãe e dos meus sogros. Queríamos partilhar a presença do bebé com familiares e amigos mas assim não dá. 

 

Ao fim do dia ainda temos a consulta no pediatra. Estamos artilhados com perguntas para lhe fazer. Todas elas devem ser triviais, mas como pais de primeira viagem precisamos de tirar esclarecimentos de tudo. A descamação da pele é normal? E o umbigo ter sangue? E as pintinhas no nariz? E os movimentos que faz com a cabeça? Deve ser tudo normal mas, como não sabemos, para nós é tudo sintomas de esclerose múltipla amiotrófica ou coisa parecida.

 

Se chegar acordado à noite, vou voltar ao ataque. Já passaram duas semanas desde que deixei o guião da Faculdade a demolhar. Agora é ir lá ver a cagada que fiz e desanimar-me por não ter piada nenhuma. Não sinto inspiração para escrever piadas. Quero reformular a cena em que o Guilherme parte a perna da cama de Rui mas não encontro uma situação melhor nem consigo tornar aquela mais engraçada. Tenho de polvilhar mais piadas, do que me lembro do texto não tem muitas. Tem a do papel com franjas mas acho que preciso de mais. Alguma coisa deve acontecer no bar que seja realmente engraçado. Um diálogo com a barmaid ou assim. Já tenho muito em que pensar até lá. Vamos ver como corre.